Aplicação do monitoramento é analisada como medida cautelar para acusado de violência doméstica; especialistas apontam avanços e desafios legais
Um julgamento em andamento na Vara de Violência Doméstica trouxe à tona o debate sobre o uso da tornozeleira eletrônica como medida preventiva. O réu, acusado de agredir a ex-companheira, pode ter o monitoramento imposto pela Justiça, mesmo sem condenação definitiva. A medida tem ganhado força desde a sanção, neste ano, de dispositivos legais que reforçam a proteção às vítimas e ampliam o uso da tecnologia no combate à violência doméstica.
De acordo com o processo, a promotoria alegou risco concreto de reiteração da conduta e pediu a tornozeleira como reforço à medida protetiva já em vigor. A vítima relatou episódios de ameaça e agressões físicas, além de perseguição. O Ministério Público argumenta que o monitoramento pode evitar contato e garantir o cumprimento da distância mínima estipulada por decisão judicial.
A defesa, por outro lado, questiona a proporcionalidade da medida, alegando que o uso da tornozeleira pode representar constrangimento público e prejudicar o o do réu ao trabalho formal. Advogados do caso afirmaram que não há flagrante descumprimento das medidas já impostas e que o acusado tem colaborado com o processo.
Apesar das ponderações, decisões recentes do STJ e tribunais estaduais têm reforçado que o uso do equipamento não depende da aceitação do acusado e que a ausência de vínculo empregatício ou a dificuldade financeira não isentam o monitorado da responsabilidade de cumprir a ordem judicial — sendo o custo do aparelho, em regra, ado pelo Estado.
Medida em expansão e com respaldo legal
Com a aprovação da Lei nº 15.125/2025, o uso da tornozeleira eletrônica ou a ser visto como política pública prioritária na prevenção de feminicídios. Estados como Goiás, Bahia e Pernambuco ampliaram a distribuição dos equipamentos, inclusive com georreferenciamento conectado ao celular da vítima, que é avisada em tempo real caso o agressor ultrae os limites estabelecidos.
Segundo especialistas em direito penal, a medida é considerada eficaz, mas levanta questionamentos quanto à sua aplicação como punição antecipada, sem o trânsito em julgado. Para a jurista Renata Valeixo, professora de processo penal, “a tornozeleira deve ser instrumento de proteção, não de exposição. Quando usada com critério, cumpre bem seu papel. Mas é preciso atenção ao devido processo legal”.
Impacto social e reintegração
Do ponto de vista prático, a imposição da tornozeleira traz desafios para a reintegração do acusado ao mercado de trabalho. Em áreas como construção civil e transporte, o estigma do monitoramento eletrônico pode ser obstáculo à contratação, segundo relato de defensores públicos que atuam em casos semelhantes. Ao mesmo tempo, a ausência de medidas eficazes de proteção tem levado à repetição de casos de violência, inclusive com desfechos fatais.
A Justiça deve decidir nos próximos dias se acata ou não o pedido da promotoria. Enquanto isso, o caso expõe o dilema enfrentado pelo Judiciário: proteger a vítima sem violar direitos fundamentais do acusado — uma equação que, cada vez mais, depende da tecnologia, mas também de sensibilidade e estrutura institucional.
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